domingo, 10 de março de 2013

FASCINAÇÃO

Passo a apresentar alguns poemas de amor, ou mais apropriadamente, de paixão, escritos no começo do ano 90. Muito ritmicos, são o começo da minha visão do arquétipo masculino que explorei em alguns personagens que depois se chamaram Alonso, Atilio e que, acredito, sempre perseguirei. O amor, tema maior da poesia, é também sua maior e talvez única visão.




 Quando sussurram as pétalas dos teus lábios
– palavras -  me crava, em gotas espessas,
um vinagre de amor não resolvido
estagnações não fazem canções.

Quando me perfumam olvidos desses negros olhos
- faíscas apagadas do paraíso que não se abriu -
só lembro cravos, só vejo trilhas espessas de
 vermelhos vermelhos vermelhos
cravos vermelhos, pálidos de fascinação

que se faz tarde
silêncio em meu coração
e só beijo em meus cravos
uma saudade que se fez cravo
que se fez cravo.
  

Quando uivo urros secos para a lua que em tantas noites
 teima em obscurecer o céu, seco lágrimas de um coração
 acelerado sempre a assentar domínios, decidir desígnios,
 esquentar delírios....

quando se faz neblina nas noites de descaso e vigília, 
transformo vultos em passos que me aquietam, 
presenças que se adensam, pois não me contaram 
os limites e os concretos e aprendi ainda em consciência 
inteireza de meu ego...

enquanto as estrelas, antigas companheiras, ficam cada vez mais nuas,
 umedeço um lábio sedento de sonhos e fantasmas,
 ardente de brasas perfuradoras
 – se o desejo não é o princípio e não pode ser o fim, 
é o eterno bálsamo, enigma ou estigma, 
fomentador  impiedoso das madrugadas insones, 
da eterna teimosia de viver...


passei por cada cravo
um gosto de mel e hortelã
percorri em cada um
                     a seiva do meu desejo
o grito do meu amor
são teus como sou tua
e entram na atmosfera
seco silvestre do teu espaço
como um carinho de amante insone
como o cravo que agrava
 – crava –  a seiva da paixão.


VERMELHOS




Não me esqueça e
                  não me recorde
só lembre os meus cravos          
só lembre os meus lábios
                           vermelhos
cravados em teu peito
trilhas de meu coração.

Mas, se meus cravos forem só gotas
de vermelho em meus olhos cansados
que se calem os perfumes
que se aquietem os queixumes
                            que me cravam
lembranças de noites vermelhas
esses cravos....



que num final de tarde sejam
vermelhos sobranceiros
porque Ti quero
                            que ti quero
ardendo como ardem cravos
morrendo em meus braços
em perfumes que se cravam
sem caminhos vermelho
                                     de agravo...


Nas naves de prata que fizeram corredores de alegria nascem as flores silvestres 
que cobrem o cinza do concreto que teima em revolver sua boca, grande gulosa.
Quando não sonho também não amo e só acredito nos duendes e fadas 
que me esperam na floresta para o dia seguinte, a manhã vitoriosa. 
Mas, agora abro meus olhos, selo meus lábiose evito os mal cheirosos
 mal estares porque o que se passa nos departamentos da poesia 
só se traduz em versos e flores e grandes amores

que só falem os meus cravos
que de vermelho arrematam
fagulhas de paixão, uma conspiração?
Vermelho em sangue doce ou quente
para embalar um princípio de canção

                            FASCINAÇÃO.

  

SENHORA


  


Foi na última noite.
A primeira tempestade da madrugada
Anunciava a chegada do alvorecer
E todos os raios que partiram
Em viagens ignoradas
Voltarão em um clarão de lucidez.

Eu só me ria, só me ria
correntes e grilhões desabando
nem barreiras nem segredos
como vivemos por tantos anos
agrilhoados obstinados.
Mas, tem a primeira madrugada.

Antes de adormecer grande despertar
palavras e conceitos
– não refaço não repiso não teorizo.
Prática pré-praxis teoria depois
sonho agora nessa madrugada.

castigos e fetiches
coração eterno coração
detive incansável
que ronda teus passos

deve estar na poeira dos teus pés
o segredo da minha paz.

Quando adormeci esquecida no perfume dos teus braços,
fiz a ultima promessa, a primeira grande tentativa.
Só falo com os lábios cerrados, só amo escancarado,
aquelas naves de prata vem logo me buscar.
Querem recados, exigem desígnios, e eu quase não me lembro de te amar
mas, se ti amo ou ti quero, vislumbro tempestades no teu castelo,
fortaleza de grã-senhor – bigodes perfumados os dentes sedentos de meu sangue...

se não sou tua mais provável que sejas meu
pois sou inevitavelmente minha, minha, minha,
sempre tão minha e tão senhora
sedenta e segura a te procurar

tantos anos e séculos para a frágil senhora
que chora e beija tantas lágrimas apaga tanto sangue
quantos olhos vermelhos paralisados cansados
      deixarei fechar.
quando comecei a grande viagem
já não interrogava mais
já não era mais
dei três voltas no relógio
amei teus olhos de pássaro preso
tua força de bárbaro bruxo
arranquei as pedras de teu castelo
espalhei brisas de orvalho
no chão que beija teus pés.


ESSES CRAVOS.....

 
   

Conspiração....  esses cravos, só lembre os meus lábios vermelhos 

cravados em teu peito.... trilhas de meu coração...

são teus como sou tua                                      PALAVRAS

sejam vermelhos sobranceiros               TI QUERO

                                                           olhos de pássaro preso

   negros olhos de hortelã e solidão

                                                           porque ti quero

                                                                 ardendo como ardem cravos



e se teimo em te amar são palavras?

meu bruxo de olhos de hortelã

negras profundidades

de gosto inesperado de sexo e eternidade
que ti quero e desejo  negros olhos
aonde se reviraram meu sexo e minha alma

mistérios desses olhos devoradores infames e silenciosos
mortalha de fogo e paixão e serenidade...

às vezes me conformo com a pequenez do Universo
com a repetição cadenciada de ritmos uniformes
das engrenagens mal lavadas
das explosões cíclicas e baratas dos interesses
em lutas e conquistas por poderes e poderosos
e símbolos e sexo e momentos e..
aí, não vivo, nem quero viver.
Mas, quando lembro que te amei e que foi
maior do que o dia e mais desafiador do que o silêncio
e o castigo que me impuseram
                       que me gritaram
                                    que me abandonaram...
sinto vontade de morrer...

e teimo em viver porque Ti quero
morrendo em meus braços
perfumes vermelhos
labaredas das noites silenciosas
em que se estende a cauda vermelha
pois de qualquer forma  não passaremos
                       incólumes
pelos portões do além.


PLANÍCIES







Silêncios - planícies escuras
sombreadas de ausências.

Percorre-las ao sentir

o gosto ácido de teus lábios.



Derrubaria qualquer obstáculo

e te amaria em qualquer deserto.

Calaria sobre a dúvida sobre a dúvida,
Deixando o fim para aqueles
que não conhecem esse grito
de amor, loucura, paz.

(serás meu ou
não serei eu)





As montanhas do outro lugar
são tua alma e minha.
Navegar.
 
 

  
EXECUÇÕES 
 



Seremos o que nos querem 
pobres e malditos seres

de beco e lata.



                                                   em surdina aconteceremos...



o que nos resta?

Dor

       refrão

de antemão.

                                                 ainda não sou eu
                                             mas sou quase ....

Sou eu ou sou você
de tão grave e tão séria
quase mais nada.

São sempre esses iluminados e ardentes
olhos de negror e lucidez e distância
que me amparam e esperam e complementam
nos instantes sem vaidade

pois só ouço o temor do som
surdo sádico satírico sedento e sonífero
que repuxa minha alma aos trambolhões.



                                           Execuções.
                                              Por minha
                                             pia
                                           porosa alma. 


Nós iguais, de alguma forma, no amor que nos temos,
 odiamos e  tememos o o reflexo
                                                           Assíduo
dessa existência que negamos.
Quando já quebramos qualquer expectativa,
sem humildade ou facilidade, piscamos três ou
quatro olhos e, sem melhores explicações
                                           nem réplica
                                           nem amparo
cedemos.

 

A VIRGEM DOS ROCHEDOS








Fui feliz enquanto o claro sereno daquela noite

- presépio e prosa – deslizava por entre meus dedos e....
encontrei tranquilidade na certeza.
Não sei tramar acordos ou entraves, só sei desenrolar um único processo, o da minha vontade.

Não sei bem se posso ser importante ou importada
para realidades alternativas  ou alteradas, antes, acho
que só posso pronunciar em ritmo obsessivo
o que me vem ao coração. Talvez falta de criatividade.
Mas, a vida me parece funcionar em um máximo de nove ou dez situações e o resto... 
eu, francamente, não entendo para o que serve, talvez seja só uma distração do tempo, 
uma falta de ajustamento ou a impossibilidade de funcionar a matéria 
em vibração adequada com as bilhões de energias que se sucedem.

Se acredito na lei do mais forte?  
Acredito que perdida no purgatório procure desesperada
a trilha a saga a senha de um perfume silvestre
que vem de florestas românticas e pouco enfeitadas,
serenas outonais pálidas esquecidas e....
bem, é o romântico das flores brancas,
das densidades suaves
perdidas entre o orvalho e o vapor.

Mas, se preciso justificar os arrebatamentos do meu temperamento, 
poderia dizer que vi em você o senhor desse mundo que está em mim
e no qual imersa e expulsa o fui por tantas vezes
sol e sombra              vento e voz
campos quentes e silêncio cúmplice
em uns pinheiros que me fazem amar
o relâmpago, a chuva, a fuga.

Quando vou para o vermelho do cálice
é porque comecei a perseguir uns passos
a nervosamente sorrir para um senhor
de bigodes negros e olhos de águia...
na floresta o riacho escurece
as árvores fazem vento e frio
a terra sob meus pés já não é tão doce,
pois, estão em ironia e soturno a me contar
que vibram e vórtice
céus e celas
não tão fáceis e serenos.

Perdida me desespero ou me encontro?
                 Fascínio
senhor dos cravos vermelhos
                       hálito de hortelã
Fascínio                          Posse
senhor do manto amarelo
sou tua e de tua floresta
um reino uma pousada....

sei, agora, que sempre fui só a moça branca
que percorreu – entre fúria e anjo – os caminhos
dos magos e aeronautas
morenos bruxos e louros alienígenas
e que ao reconhecer o traço e o largo
o dono e o princípio
me debato me arruíno me fascino.


Por sob a terra a luz amarela
escura de redenção
enquanto assentavam os magnetos
- assentimento pelo brilho –
beijei da Vinci e seus retratos
pois inquietamos na arte a consciência
que enfrenta a montanha e seu quietar.

Tomamos forma e fazemos do sonho um concreto
arquétipo na ideia é morada e finalidade.
Não existe, talvez por isso mesmo, nada
que impeça o minuto de reconhecimento.
Se pertence ao que se veio, de onde se é,
e se caminha por entre barras e barganhas
para um acerto
para o que não se sabe
porque em ritmo e fluxo de dança
                 movimento
o pensamento é a arte de viver e sonhar.

Entre o céu e o seu sol
e seus filósofos
Sócrates Aristóteles Eisten e Renoir 

estrelas e sua lua
silvestre e hortelã  rochedos e da Vinci
os senhores e seus mosteiros
         silêncio
as virgens vão passear.

Carregam flores brancas
cachos castanhos
túnicas de pálido luar.
Entre a floresta e aluz
      posuídas 
e distraídas
nem as aves  nem as traves
são mulheres e são flores
são o princípio do dia
e seu caminho de paz.